Vi que o Cristiano Costa também comentou sobre o movimento contra o aumento das passagens de ônibus. A preocupação do blogueiro em chamar à atenção dos estudantes o fato de que o aumento de preços está sendo generalizado na economia, por conta da inflação provocada pelo governo federal, é bastante válida. Contudo, mudar para este lado o foco das reivindicações parece perder sentido no contexto mais geral das manifestações – isto por alguns motivos.
Primeiro, como vimos em post anterior, se já é difícil agregar pessoas para se manifestar por algo concreto como o preço da passagem de ônibus, que elas pagam e sabem quem mandou aumentar, mais complicado ainda é mobilizá-las para lutar contra algo abstrato e cujas causas e consequências não lhes são aparentes, como a inflação. Seria excelente vermos uma passeata contra a leniência do governo federal em relação à deterioração do poder de compra do trabalhador. Entretanto, da mesma forma que pouco vemos qualquer indivíduo – seja doutor ou secundarista – se mobilizando contra diversos absurdos deste país, pelos mesmos problemas de escolha pública dificilmente veremos alunos lutando por um bem maior que fuja diretamente de sua realidade. Shikida parece ter o mesmo ceticismo com relação a isso.
Outro ponto interessante é justamente a gama de informações que o Cristiano elenca para os estudantes coletarem de modo a tentar entender o custo dos transportes – tais como a incidência de impostos e o peso dos combustíveis. Mesmo economistas e contadores teriam dificuldade de dominar como se comportam os custos do setor, a não ser que sejam especialistas na área. Em um grupo heterogêneo de estudantes e movimentos sociais, das mais variadas formações, poucos manifestantes terão formação e bagagem técnica para avaliar este tipo de informação – quiçá nenhum. E nem deveriam ter. Este fato em particular reforça o ponto de que os usuários de transporte são o elo mais fraco desta disputa – como falamos no post anterior, além da desvantagem com relação à coordenação, por serem interesses difusos, ainda há a informação assimétrica em comparação à informação detida pela empresa concessionária e o governo.
O fato é que a alegação geral dos estudantes parece ser na direção de uma relação, digamos, não muito saudável entre o governo e as empresas concessionárias. Justificar formalmente aumento de custos não seria difícil em uma situação em que isto esteja ocorrendo. Se essa simbiose acontece de fato ou não é algo a ser investigado, mas algo que a teoria econômica tem a nos dizer é que neste tipo de relação, em que se cria um monopólio legal, o rent-seeking é sim bastante plausível.
Caso este cenário esteja correto, a luta dos estudante teria de ser local mesmo. O aumento geral de preços é um problema, mas a estrutura de privilégios de mercado erguida, com suas distorções, é outro. Todavia, vale frisar: para reformar o setor de transportes, de modo a eliminar os incentivos perversos, não adianta conseguir colocar um representante do DCE e do movimento social X, Y ou Z no conselho ou outras coisas do gênero, tais como realizar mais debates e “abrir canais de comunicação”. Se as razões para a existência do rent-seeking permanecem intocadas, no longo prazo, estas lutas estão fadadas ao fracasso.
Bem, eu não tenho ciência da composição de custos de uma empresa de ônibus, mas acredito que não seja regulada pelas oscilações do IPCA, como faz acreditar o Cristiano, quando afirma que se “o IPCA 2011 foi 6,5%, os R$ 0,15 de aumento apenas atualiza o valor.”
Bem, como qualquer outro índice de preços, o acima citado é uma média ponderada de diversos custos (entre bens e serviços) com os quais as famílias brasileiras, de 01 a 40 salários mínimos, têm de arcar diariamente. O transporte coletivo é um dos itens que compõem a elaboração do IPCA, o qual já foi discutido aqui (https://analisereal.wordpress.com/2011/12/08/ana-maria-braga-e-a-educacao-economica/).
Desta forma, o aumento da passagem de ônibus assim como poderia ter aumentado mais do que os 6,5%, poderia ter aumentado menos. E de fato aumentou um pouco mais; segundo dados do Cristiano, 6,8%. Portanto, acredito que a intenção dele foi essa mesmo, de salientar que o aumento de preços levado a cabo pelo governo federal é generalizado na economia.
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