Capitalismo para os pobres. O supra-sumo da discriminação de preços.


Os projetos estão andando, pouco tempo para procrastinar. Mas nem por isso deixo de compartilhar leituras interessantes de outros blogs, que atualmente tem mais tempo de procrastinação produtiva do que este.

Diogo Costa entra no mundo da blogosfera com o provocativo Capitalismo Para os Pobres. Diogo busca recuperar o caráter “progressista” do capitalismo, mostrando como este, quando bem aplicado, beneficia os mais pobres; busca diferenciar entre defender o mercado para todos, e defender privilégios de mercado para algumas empresas, que é o que atualmente se vê no Brasil: um capitalismo de compadres (ou de laços).

Enquanto os ricos têm capitalismo, aos pobres resta o fardo de uma economia ineficiente e regulada:

Pense no varejo. Rico faz compras em Miami. Pobre fica entre comprar produtos chineses altamente tarifados ou o substituto nacional altamente tributado. Pense no trabalho. Rico trabalha como Pessoa Jurídica. Os encargos trabalhistas não abocanhem seu salário. Pobre trabalha amarrado pela CLT. Todo empregado pobre é um trabalhador mais suas circunstâncias fiscais. Pense nas finanças. Rico consegue empréstimos subsidiados pelo BNDES. Pobre tem que pagar juros exorbitantes incluindo os subsídios governamentais. Pense na construção civil. Rico consegue licitação de obras com garantia lucros. Os pobres pagam a conta caso o projeto do rico dê errado. Pense nos impostos. A tributação brasileira é regressiva. Ricos pagam proporcionalmente menos tributos que os pobres.

Em post(s) futuro(s), vou tentar mostrar que essa visão “progressista” sobre o livre-mercado não é ou foi esposada somente por liberais, mas também o foi por muitos dos primeiros reformistas sociais (socialistas, anarquistas).

Alex Tabarrok nos traz um caso curioso de discriminação de preços, talvez o mais engenhoso que já vi.

Você já se perguntou por que companhias áreas vendem a passagem mais cara quanto mais próximo se está da viagem?

É uma forma de discriminar preços. Em geral, aqueles que compram a passagem em cima da hora tem algum compromisso inadiável (como uma reunião de trabalho) e estão dispostos a pagar mais caro. Os que desejam apenas passear são mais flexíveis e mais sensíveis a preços; se a passagem para certo destino e data ficar muito cara, muda-se ou a data, ou o destino, ou ambos. Assim, quem compra com antecedência, em geral, é aquele com a demanda mais elástica, e as companhias aéreas dão desconto.

Mas a única forma de discriminar preços seria pelo tempo da compra? Não. Aparentemente, a empresa GetGoing.com inventou uma nova forma: você escolhe dois destinos para os quais deseja ir e a data. A empresa então sorteia um desses destinos aleatoriamente e compra para você, com cerca de 40% de desconto. A relação é ganha-ganha: você viaja a menor custo; a companhia aérea consegue discriminar preços de maneira mais eficiente, pois, se você é tão flexível assim com relação ao local, você é um passageiro de demanda bastante elástica.

O lucro é justo?


Imagine dois homens.

Um deles trabalha de sol a sol e, se consumir tudo o que ganha, permanecerá pobre. Ao final do ano não estará mais rico do que no começo, nem terá outra perspectiva além de reiniciar todo o processo novamente.

Já o outro homem, atualmente, nada faz, nem com as mãos, nem com o cérebro. Ele não trabalha, contudo, vive bem; tem tudo em abundância; pratos finos, roupas elegantes, mobília suntuosa. Ele vive da renda de seu capital. Ele consome artigos produzidos com o suor dos trabalhadores, pois tais coisas não surgem do nada; foram eles que plantaram o milho, teceram as roupas, construíram a mobília.

Se o trabalhador consumir qualquer excedente que tenha gerado, ele estará sempre no mesmo ponto de partida. Um mesmo trabalho é remunerado somente uma vez. Mas, se o rentista consumir a totalidade de seu ganho anual, ele terá, no ano seguinte, e por toda a eternidade, uma renda fixa e perpétua. O capital, portanto, não é remunerado uma vez, nem duas, mas indefinidas vezes.

“Nesse arranjo social”, indaga Bastiat, “não há um mal monstruoso a ser reformado?”. Indo além, se o rentista não gastar parte de sua renda, ele conseguirá, sem outro esforço, aumentar seu capital de maneira tão rápida que, em pouco tempo, consumiria o mesmo tanto que cem famílias da classe trabalhadora. “Isso tudo não prova que a sociedade em si carrega em seu seio um horrendo câncer, que deve ser erradicado, mesmo sob risco de algum sofrimento temporário?”

É deste modo que o liberal francês inicia seu panfleto Capital e Renda . Isto se passou no ano de 1849, após a revolução francesa de 1848, em um momento de turbulência social em que o socialismo ganhava força. Bastiat direcionou o texto aos trabalhadores de Paris simpáticos às promessas revolucionárias, personificadas, principalmente na França, por Proudhon. E, a despeito do início acima destacado, o objetivo era dizer que sim, a remuneração do capital é justa, mesmo com sua natureza perpétua.

Esta e outras obras de Bastiat encontraram repercussão positiva na classe trabalhadora parisiense. Isto preocupou a frente socialista, levando Chevé, um redator do jornal de Proudhon à época – A Voz do Povo -, a escrever contra as conclusões do liberal. A despeito das críticas, Proudhon abriu as portas à Bastiat, permitindo uma réplica no mesmo jornal, atitude difícil de se observar em debates com oponentes de visões tão distintas: “(…)deixamos abertas as colunas (do jornal) para o nosso adversário; publicaremos seu artigo inteiro, não faremos comentários sobre ele, a fim de não influenciar o julgamento de nossos leitores, e para igualar as vantagens da controvérsia entre o nosso antagonista e nós mesmos”.

A resposta de Proudhon viria somente na semana seguinte; a partir de então, ele toma o lugar de Chevé no debate. Após, tanto o liberal Bastiat quanto o socialista Proudhon trocam mais dez cartas no jornal, sob os olhos do público, acerca da natureza e da legitimidade do lucro. O debate é finalizado com uma última resposta, não publicada, de Bastiat, pois ao final as acusações partiram para argumentos ad hominem por parte de Proudhon.

Este é um debate bastante interessante da HPE, que passa sobre a discussão da origem e legitimidade do lucro, divisão social do trabalho, crédito e, inclusive, sobre a proposta de crédito gratuito para os trabalhadores. Caso você, como eu, tenha se interessado pelo episódio, continue lendo aqui.